Está a chegar o Inverno. E com ele o receio. Receio da chuva e daquilo que possa acontecer.
Depois do temporal de 20 de Fevereiro é inevitável este sentimento. Eu própria, que não sofri consequências directas deste temporal, confesso que tenho algum medo.
Ainda existem algumas marcas da destruição.
Na minha mente ainda persistem várias imagens.
Depois há especialistas (ou não) que dizem que se este ano chover tanto como choveu no ano passado o cenário será bem pior. Eu até nem costumo dar ouvidos a este tipo de "agoiros" mas confesso que me assusta.
E as pessoas que foram verdadeiramente afectadas pelo temporal? Que perderam pessoas? Bens?
Acredito que essas pessoas têm feridas abertas que jamais irão sarar.
Eu não estava no Funchal. Estava do outro lado da ilha. Aqui nada fazia crer que do outro lado se estava a viver uma tragédia, até a noticia se espalhar através da rádio. Tentei falar com o A. que estava no Funchal e já não consegui. Tínhamos falado por volta das 9h. Sabia que tinha estacionado na baixa e tinha se dirigido para o local de trabalho. Às 11h da manhã já não consegui contactá-lo. E só voltei a ter noticias dele ás 21h. Mas só consegui falar mesmo com ele por volta das 23h.
Cada vez que nas informações davam conta de mais um morto, sentia um aperto no coração. Mais tarde acabei por afastar todo aquele medo mas, houve pessoas que não tiveram a mesma sorte.
Ainda hoje se fala na tragédia em todo o lado, todos têm uma história para contar. Todos conhecem uma ou outra pessoa que perdeu alguém. Uma pessoa que passou dificuldades. Alguém que viu a morte á sua frente. Eu conheço. E nunca me vou esquecer o que aquela sra. me contou no dia que conseguiu ir trabalhar. O olhar arrasado. As lágrimas. O terror estampado no rosto.
Também não irei esquecer que um dia depois de tudo isto acontecer (domingo), á noite ligou o meu chefe a dizer que tinha que ir trabalhar no dia seguinte. Que já tinha estado no edifício, o acesso não era fácil mas que se conseguia fazer. Não tive palavras, mas não acreditava no que estava a ouvir. Naquela segunda-feira era impossível alguém deslocar-se ao seu local de trabalho. Aliás, as autoridades pediam exactamente o contrário. O edifício (edicio público mas não um serviço essencial) onde eu trabalho está numa das zonas mais afectadas. Está na margem de uma das ribeiras. À volta estava tudo destruído. Os acessos não eram fáceis. Na minha primeira tentativa de passar para aquele lado da ribeira, caí numa poça e fiquei com lama até aos joelhos. Sabia que naquela zona tinham sido encontrados até o momento 3 cadáveres. Sabia que aquela lama tinha arrastado alguém. Foi uma sensação tão estranha. Naquele dia achei o meu chefe a pessoa mais insensível do mundo. (Mas nem é essa a ideia que tenho dele)
Não foi o que mais me impressionou, mas é uma imagem que nunca vou esquecer, pessoas a estacionar nas ruas periféricas ao Funchal e deslocarem-se a pé em multidões até ao centro para ajudar nos trabalhos.
Tudo isto para dizer que este Inverno será particularmente dificil para tantas e tantas pessoas.
Repito, tenho medo deste Inverno.
Eu que não estava aí fiquei chocada. Quanto mais os Madeirenses.
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